Manifesto contra a invasão militar nas favelas da Maré
Escrito por um grupo de moradores
Expressamos publicamente o nosso total repúdio à “ocupação” militar nas favelas da Maré.
Estamos e muito preocupados com a nossa vida e com a vida de todas e todos que moram no Conjunto de Favelas da Maré. Nos preocupamos também com todos os outros favelados e faveladas que sofrem com a crescente onda de militarização e ataque direto de um Estado cada vez mais armado para agir contra estes que desde sempre tem que lutar para garantir o seu lugar na cidade.
É visível que quem usa tanques de guerra contra a sua própria população não busca diálogo, ainda menos participação e tampouco está preocupado com os nossos direitos. O tanque apontado para nós é uma violação mais do que somente de direitos, é uma violação a qualquer ideia de Estado democrático de direito. A ocupação militar nem começou e o projeto já faliu pelo que é: mais um ataque brutal militar contra territórios populares urbanos.
Quem está declarando guerra com estes ataques?
A prefeitura, com o seu prefeito Eduardo Paes do PMDB apoiado pela coligação “Somos um Rio”, que além do PMDB conta com mais dezanove partidos: PRB, PP, PDT, PT, PTB, PSL, PTN, PSC, PPS, PSDC, PRTB, PHS, PMN, PTC, PSB, PRP, PSD, PCdoB e PTdoB.
O governo do estado do Rio de Janeiro, com o seu governador Sérgio Cabral (PMDB), que acabou de passar o seu cargo para o vice Luís Fernando Pezão (PMDB) apoiado pela coligação “Juntos pelo Rio” que além do PMDB conta com mais quinze partidos: PP, PDT, PT, PTB, PSL, PTN, PSC, PSDC, PRTB, PHS, PMN, PTC, PSB, PRP e PCdoB.
O governo federal com a presidenta Dilma Rousseff (PT), apoiado por uma coligação que além do PT conta com mais nove partidos: PMDB, PDT, PSB, PR, PC do B, PRB, PTN, PSC e PTC.
Que partidos são esses que declaram a guerra contra nós cidadãos? Que Estado é esse que prefere se armar cada vez mais, atacar com mais violência os seus cidadãos? Que comunidade internacional é essa que assiste calada a este cenário? Que FIFA é essa, que Comitê Olímpico é esse, que estão nem aí pelo acirramento do ataque às classes populares em curso desde que decidiu-se realizar estes mega-eventos no Brasil? Que visam antes de tudo seus ganhos milionários, ganhos a qualquer custo, pagos por nós?
Há 50 anos do golpe militar é mais do que preocupante a promoção midiática do uso do exército para oprimir. É inaceitável o uso da força bruta para construir uma cidade que prevalece o enriquecimento de poucos. É inaceitável que governantes estejam preocupados muito mais com uma Copa do Mundo aponto de priorizar e de gastar valores absurdos da verba pública, no evento que durará um único mês, em vez de estarem preocupados com boas escolas, bons hospitais, bom saneamento, bom transporte e que todos estes direitos sejam públicos e acessíveis, os quais precisamos 365 dias por ano. Em vez de melhorar o que nas favelas já construímos, continuam vindo para destruir, para remover, para torturar e para matar.
Sentimos no dia-a-dia, o quanto este projeto de cidade que nos impõem está podre. Horas e horas em engarrafamentos, em meios de transporte caros e miseráveis, na destruição de milhares de casas, na perseguição violenta de moradores em situação de rua, muitas vezes expulsos de favelas com UPPs, nas torturas e nos assassinatos cometidos por agentes do estado – a lista é longa em falar como sentimos que o projeto de cidade em curso não está preocupado com o bem-estar comum e sim com o muito bem-estar de poucos. Não queremos este projeto de cidade e ainda menos aceitamos que ele seja garantido através da invasão das tropas nos nossos bairros.
Não deixemos de lutar por uma Maré e um Rio sem opressão e violência. Chega de apontarem suas armas para nós!
Não à “ocupação” militar da Maré e de qualquer território popular!
Não às torturas e às mortes nas favelas!
Rio de Janeiro, 05 de abril 2014